Celacanto, o "fóssil-vivo"
Imagine que você esteja andando em uma feira e descobre que estão vendendo um Tyranossauro rex. A sua expressão de surpresa talvez fosse comparável a um pesquisador que viu um Celacanto sendo exposto em uma feira na África do Sul, no Natal de 1938. O espanto era porque esse peixe, exatamente como o achado na feira, só existia até o Cretáceo, época em que viviam os grandes dinossauros como o T-rex. O achado provocou um grande alvoroço porque os Celacantos estão muito envolvidos com a evolução dos Tetrapoda e a conquista do ambiente terrestre.
Pra começar, vamos tratar da importância do fóssil. Um ponto que intrigava os naturalistas é como vertebrados, que tinham formas de peixe, conseguiriam dominar a terra com 4 membros robustos, com ossos e uma estrutura especializada. Muito se duvidava da evolução gradual de estruturas inteiras como uma pata. Alegavam que uma "perna primitiva" só atrapalharia o animal. No entanto, descobertas fósseis mudaram o discurso. Acharam alguns peixes que continham pedúnculos musculares e ossos na base das nadadeiras pares (peitorais e pélvicas). Dessa forma as nadadeiras se assemelhariam muito ao modo de locomoção e morfologia dos membros dos vertebrados atuais. Deram a esse grupo de peixes o nome Sarcopterygii (sarkos, 'carne' + pteryx, 'barbatana'). Inclusive se conhecia de vários sítios arqueológicos um gênero chamado Latimeria, que pertenceo celacanto.
A formação com músculo e osso foi a base para essa estrutura ser aprimorada com milhões de anos de seleção. A perna dos vertebrados não surgiu do nada, mas passou por muitos e importantes passos. Esses membros, essenciais para a conquista do ambiente terrestre, já serviram com o mesmo mecanismo de funcionamento principal, para a locomoção do celacanto nas águas profundas. Celacanto aliás significa "coluna oca" em alusão ao osso presente na barbatana. Celacantos atualmente vivem em cavernas submarinas de águas profundas habitando o Oceano Índico. Eles são pegos por acaso em redes de arrasto em localidades da costa oriental da África do Sul, Ilhas Comores (Moçambique) e até na Indonésia. Esse habitat amplo, estável e relativamente protegido de grandes eventos na superfície pode ter servido para a manutenção da morfologia que não mudou desde o Cretáceo onde sumiu no registro fóssil e nem sofreu grandes alterações desde o seu surgimento no Devoniano. Por isso, ao retirar da água um animal semelhante ao fóssil do Cretáceo, conferiram a ele um termo de "fóssil vivo".
Mas da perna que dominou a terra até as nadadeiras dos celacantos, algumas outras mudanças são observadas. Os Sarcopterygii se dividem na linhagem que estão os celacantos e em Coanata, grupo que contém os peixes pulmonados, característica que os aproximam mais dos Tetrapoda que o celacanto. Entretanto, a presença desta estrutura mostrou que essa característica se desenvolveu e é útil a outro propósito nesta linhagem. Estudos indicam que as nadadeiras musculosas estabilizam correntes verticais nos celacantos e permite manobrabilidade. Podemos ver celacantos movendo seus membros e só foi possível ter certeza depois de acharmos exemplares vivos. Estudos genéticos e de sua biologia puderam ser feitos e foi um grande achado para entender como se deu a evolução deste grupo.
Devido à manutenção de sua forma, o genoma dos celacantos foi sequenciado em um artigo da Nature em 2013 revelando que seus genes evoluíram mais lentamente que os do tetrapódes, mas mesmo assim, apresentam uma grande variabilidade genética. O que ocorre é que a variabilidade genética não é apresentada como diversidade morfológica. Estudos como esse são muito importantes para análises evolutivas como relógio molecular e evolução morfológica. Devido à pesca de arrasto, essa espécie está em risco. Poucos dados ainda divergem sobre o grau de vulnerabilidade dos celacantos, mas é um sinal amarelo para conservação desta espécie que carrega, a tanto tempo, um pouco de nossa própria história.